Rangel Alves da Costa
Não vai demorar muita e estarei retornando a Poço Redondo de mala e cuia. Isso mesmo, retomar o caminho de casa e novamente fincar moradia no meu berço de nascimento. Ainda não fiz isso por que não avistei um meio de sobreviver com dignidade na terra sertão. Quer dizer, de me manter como me tenho mantido até agora. E o custo de vida é mais alto que se imagina.
Minha profissão e meus ofícios não terão muita serventia, principalmente por que não pretendo advogar em Poço Redondo. Impossível advogar - defender uma parte num processo - quando todos são amigos. E basta eu representar alguém ou família até em coisa simples, como um divórcio ou inventário, e os outros já catarão pedras para jogar sobre mim. Não quero assim. Só tenho amigos em Poço Redondo, fato que dificulta até cobrar um valor justo por uma ação.
Difícil dizer, mas até hoje não consegui juntar nada de dinheiro que sirva como garantia futura. Não tenho carro, não tenho casa própria, não tenho anel dourado no dedo, não tenho valores em bancos, não tenho cartão de crédito ilimitado. Não tenho luxo em nada nem procuro ter além do que realmente necessito. Na verdade, só tenho eu mesmo e o que sou.
O que sei pelo estudo e esforço, certamente não teria qualquer valia numa feira, num mercadinho, no pagamento de contas. O mundo é do dinheiro e dinheiro não tenho. Escrever, como sempre faço, alimenta a alma, mas não o organismo. Mantenho o Memorial Alcino Alves Costa com o maior esforço do mundo, e assim o faço como se minha própria vida estivesse em meio aquele acervo.
Nunca trabalhei em prefeitura (a não ser num breve período de dois meses que fui nomeado secretário de cultura do prefeito Roberto Godoy, mas forçado a deixar a função após o seu rompimento político com meu pai) e certamente não trabalharei. Dificilmente uma prefeitura vai querer nos seus quadros uma pessoa que pensa e que tem voz própria.
Ademais, jamais aceitaria trabalhar numa prefeitura ou órgão qualquer e depois ser forçado a me submeter ao nojento submundo da bajulação, do puxa-saquismo, da adulação. Do mesmo modo, jamais transformaria minha ética pessoal e minha conduta em nome da defesa do indefensável.
Mas retornarei assim mesmo. Quem sabe eu transgrida meu íntimo e acabe abrindo um escritório de advocacia. Pouco importa que eu defenda uma parte conterrânea contra outra parte conterrânea. Haverão de entender que minha ação é profissional e não por escolha ou gosto pessoal. Pensarei mais sobre isso.
Contudo, a minha vontade mesmo era de retornar e passar a viver afastado do centro. Uma casinha no mato, uma rede, um silêncio e um papel de escrita. E então eu estaria realizado e seria a pessoa mais afortunada do mundo: a riqueza de ter apenas aquilo que gosta. Nada mais que isso.
Que vida boa e que encanto de viver. No meio do mato, juntinho à natureza, acordando na madrugada, caminhando pelos arredores, conversando com os bichos, vivendo em profundidade. Tudo na simplicidade e singeleza do mundo. Abraçando a terra como manto sagrado que alimenta a vida.
Assim retornarei ao sertão, ao meu berço de nascimento. E vou em busca da lua maior, do sol mais quente, da terra mais calorosa e do bucolismo que tanto bem faz ao coração. Um viver tão simples que até o passarinho me chamará para voar.
Escritor
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