*Rangel Alves da Costa
Há uma frase rotineiramente expressada em momentos de dor pela perda de filhos: Os pais nunca deveriam enterrar seus filhos! E assim por que, presume-se, seria da normalidade da vida que os mais jovens se despedissem pela partida dos mais envelhecidos. Os filhos é que deveriam levar seus pais à última moradia terrena.
No mesmo sentido, diz outra frase entrecortada de angústia: Uma mãe não merece enterrar um filho! E não merece por que na perda há também o perecimento de uma parte que é sua, de seu ventre, de sua vida. Além da aflição pela despedida, certamente a dor pela perda daquilo que é seu e que foi ceifado pelo destino. E por isso mesmo que muitas vezes, em prantos, as mães pedem que a levem e não os seus.
Essa dor dos pais pela perda dos seus vem desde o surgimento do mundo e causando o mesmo sofrimento a cada passo da evolução. Quem não se lembra daquela Maria chorando seu filho crucificado numa cruz? A dor de uma mãe, as lágrimas de uma mãe, o sofrimento indescritivelmente profundo de uma mãe. Mas nada do que demonstrado na face é mais forte e mais terrivelmente mortificante do que o abismo interior que é aberto.
Sim, os pais igualmente sofrem, mas por que a dor da mãe é sempre mais alentada, mais contundente, mais visivelmente exposta? Pelo fato de que a mãe nunca gesta totalmente o seu. Por que a mãe nunca desprende de seu útero totalmente um filho. Por que a mãe nunca desaparta de suas entranhas a sua cria. Um filho que nasce continua eternamente no útero da mãe. E após nascer, além de sua raiz primeira continuar, outras raízes começam a surgir no amor, no cuidado, na criação, nas preocupações do dia a dia. E assim pela vida inteira.
E é por isso mesmo que o sofrimento é tanto na ocorrência da perda de um filho. As mães sofrem quando filhos não vingam ao nascerem, as mães padecem quando os filhos não se sustentam por muito tempo depois de nascidos, as mães se mortificam todas as vezes que um filho se vai ainda na juventude ou em qualquer idade. Contudo, situações existem em que a dor se torna se torna ainda mais lancinante: perder um filho ainda jovem e pela violência e desumanidade de outros seres humanos.
Sim, muitas vezes os filhos procuram caminhos obscuros, violentos, verdadeiros chamarizes para fatalidades. Muitas vezes os filhos passam a se envolver com drogas, com quadrilhas, com todos os tipos de ilicitudes. E passam a ter uma vida vulnerável demais. Os acontecidos demonstram os tristes finais para os que trilharam por tais labirintos. Contudo, ainda assim, mesmo já continuamente padecentes pelos difíceis caminhos tomados pelos filhos, todas as mães sofrem a dor maior quando os seus são ensanguentados pela violência.
Infelizmente, há de se reconhecer que os sofrimentos das mães estão cada vez mais acentuados. O mundo está violento demais, a vida está difícil demais de ser vivida. Toda vez que um filho sai, sua mãe logo se enche de medos, de preocupações, de temores. Sabe que seu filho é um menino bom, pacato, pacífico, que não gosta de malandragem, de desordem ou de meios ruins. Mas não há jeito, pois sempre haverá o medo do que possa acontecer da porta da frente em diante. Ora, a bandidagem está por todo lugar, a violência está em cada esquina e em cada canto, ninguém possui segurança em lugar algum.
O mais difícil é saber que as preces, os rogos e as orações, os pedidos e os alertas, as palavras repetidas mais uma vez, de nada surtiram efeito. Então chega a notícia mais terrível do mundo. Então alguém chega correndo para avisar sobre um triste acontecido. O seu filho esvai-se em sangue, o seu filho corre perigo, o seu filho está à beira da morte, o seu filho foi levado ao hospital, o seu filho foi morto! E então, o espanto surdo, a descrença. Não, não pode ser verdade, nada disso pode ter acontecido, o seu filho está bem. Mas não. O seu filho foi violado pela violência do homem. O seu filho foi vitimado pela insanidade sanguinária dos dias de hoje. E então o grito!
Por essas mães que todos os dias choram seus filhos ensanguentados, por essas mães que todos os dias desabam em prantos pelos forçosos adeuses que são dados, por essas mães que sempre pedem para serem enterradas em lugar dos seus, digo apenas: Por mais que o conforto divino tenha a força de amenizar a dor de uma perda, por mais que os prantos derramados aliviem os sofrimentos, por mais que a força interior encontrada vá conseguindo levar a vida adiante, jamais deixe silenciar a cruz do seu.
E não deixar silenciar a cruz do seu significa denunciar, gritar, bradar contra a violência. Significa ainda orar para que a mesma dor não acometa outras mães. Significa pedir a Deus que nunca desampare a vida e derrame a paz aonde escorrem os rios de sangue.
Escritor
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