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sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

NESSA MATÉRIA PROCURAMOS TRAZER AOS ASSOCIADOS DO GRUPO UMA NOÇÃO SOBRE A ALIMENTAÇÃO DOS CANGACEIROS NA CAATINGA DO SERTÃO NORDESTINO

Por Sálvio Siqueira

CARNE, FARINHA, RAPADURA E QUEIJO

Naquela época, tempo do cangaço, tanto os bandos de cangaceiros quanto as volantes se danavam de mata adentro por dias. Suas paradas eram rápidas e a ingestão de alimentos, quanto era possível, tinham, basicamente, os mesmos produtos, carne seca, farinha, rapadura e, quando possível, queijo de coalho. Esse tipo de queijo, em sua preparação artesanal, leva sal, portanto podia ser transportado por vários dias nos bornais.


Como se passava bastante tempo fugindo e perseguindo, sabia-se quanto partir, nunca quando retornar, tinha que ser levado um tipo de alimento que não tivesse data de vencimento tão pouco se deteriorasse. A quantidade não podia ser grande devido ao peso. Cada homem tinha que levar suas armas, brancas e de fogo, munição, uma espécie de lençol e água. Segundo relatos dos pesquisadores, o peso que cada volante transportava ficava em torno de 30 kg. Como os volantes, os cangaceiros também levavam tão quanto, ou mesmo mais peso em seus corpos.


No início, os soldados das volantes transportavam seus mantimentos e parte da munição em uma mochila nas próprias costas. Erro grave para quem tinha que andar dentro da caatinga se esgueirando de espinhos, galhos e em um solo totalmente acidentado. Já os cangaceiros dividiam o peso pelos lados do corpo. Depois de fazerem essa divisão, os ‘lençóis’ serviam de amarração nas reatas dos bornais para os mesmos, ficando fixos em cada lado do corpo, não atrapalhassem as caminhadas onde tinham que se agachar às vezes se arrastarem mesmo, se erguerem e/ou mesmo apertarem o passo numa fuga. Só após a entrada dos próprios sertanejos na linha de frente das volantes, temos como pioneiros os nazarenos, é que a divisão da tralha pessoal ficou igual a dos bandoleiros, facilitando e dando maior liberdade de movimentação à tropa.


Sabemos que a falta de condução motorizada na época era bastante alta, quase não tendo e que, em muitos lugares, não havia de maneira alguma, principalmente pela falta de estradas de rodagem. A condução existente, quando tinha, era de tração animal mesmo. Porém, os animais não podiam entrar em todo lugar e deixavam rastros fáceis de serem descobertos e seguidos. Os bandoleiros faziam a maior parte de seus deslocamentos a pé. Principalmente onde existissem cordilheiras de elevações, serras contínuas, por vários motivos, um deles era a possibilidade de avistarem uma vasta região identificando se haviam perseguidores em seus ‘calcanhares’ e a elevação lhes darem melhor posicionamento numa eventual troca de tiros.


Os cangaceiros andavam, em média, quinze a vinte léguas por dia. Cerca de 90 a 120 quilômetros diários. Segundo dados atuais, dependendo do tamanho do corpo de uma pessoa, isso sem levar consigo algum peso além do próprio corpo, em um ritmo de caminhada para exercícios físicos, a mesma perder peso e facilmente chega a queimar 450 calorias por hora caminhada. Por exemplo: uma pessoa de 75 quilos caminhando a 7,5 km/h por uma hora irá queimar aproximadamente 440 calorias por aquele percurso feito. Lembrando que 7,5 km/h tem apenas a distância de uma légua e 1.500 metros percorridos. Cientistas comprovaram que quem caminha com frequência emagrece 25 vezes mais do que quem não realiza essa prática. “Um estudo japonês comprovou que andar cerca de 30 minutos após o jantar provoca uma perda de peso duas vezes maior do que caminhar de estômago vazio. Passear a essa hora reduz os níveis de açúcar no sangue e a gordura corporal.” Então entra o trabalho de um profissional em nutrição:


“Café da manhã
· 1 copo de shake: 200 ml de iogurte desnatado + 1 banana + 1 col. (sobremesa) de farinha de linhaça dourada
· 2 fatias de pão integral + 2 fatias de peito de peru cozido lanche da manhã
· 1 xíc. de chá verde + 2 ameixas secas
Almoço
· Salada de folhas verdes com palmito e tomate (salpique semente de girassol)
· 1 sobrecoxa assada com molho de laranja
· 2 col. (sopa) de arroz integral com ervilha
· 1 cenoura no vapor
Lanche da tarde
· 1 taça de gelatina diet batida com 1 iogurte desnatado
Jantar
· Salada de folhas verdes com pepino e abóbora em cubos
· Purê de inhame
· 2 fatias finas de carne assada
Ceia
· 3 col. (sopa) de albumina (suplemento) batida com 1 copo de leite desnatado
· 1 fruta”
(cardápio proposto pela nutricionista Ana Paula Mendonça no site mdemulher.abril.com)

Através de uma longa pesquisa, mostraremos, mais ou menos, como era a alimentação dos bandos de cangaceiros e seus perseguidores, e quais as proteínas, calorias e nutrientes existiam nas mesmas.


Para manter a cabroeira alimentada, os chefes cangaceiros teriam que se virar de várias formas, maneiras, tais como mandar pegar uma rês solta no mato, matar e ‘fazer a carne’, pegarem criações tais como bodes, carneiros ou mesmo porcos nos chiqueiros erguidos próximos aos terreiros das casas dos roceiros e, muitas das vezes, pagavam por valores redobrados daquele que realmente valiam. Isso por que necessitavam do alimento outras vezes e do “silêncio” do dono. As volantes também faziam o mesmo, porém, com a diferença de não pagarem ou, quando muito, davam um papel para que o dono, proprietário, fosse à cidade mais próxima procurar algum órgão público receber do governo. Ora, duvido que algum lavrador, morador, roceiro, pegou aquele pedaço de papel e foi tentar receber. Tinham medo, pois a visita de uma tropa volante não era não agradável para eles. Além dessa providência, tipo de proteína, eles tinham que comprarem rapadura, farinho e queijo. “A manutenção de um grupo de cangaceiros envolvia uma série de estratégias que exigia muita habilidade para se atingir os resultados e, se tratando de um bando numeroso como o de Lampião, as despesas aumentavam de forma considerada.” (AM. 2015)


Carne

Alimento rico em proteína possuindo outros nutrientes como vitaminas do complexo B e sais minerais. Fonte de Ferro, Zinco, Fósforo, Potássio, Magnésio e Selênio. “Os indivíduos do cangaço encontravam na carne sua principal fonte de reposição protéica. Uma vez assada ou mesmo guisada, esta última menos frequente nas andanças cangaceiras, era lentamente mastigada no canto da boca para absorver o precioso caldo, ligeiramente intricado com o sal, que interagia com a farinha de mandioca formando um bolo alimentar que era quebrado pelo acréscimo do rapaduresco doce.” (AM. 2015)


Farinha (de mandioca ou de milho)

Uma porção de 100 gramas de farinha de mandioca contém 340 calorias. A maior parte destas, 94%, vem dos carboidratos. Aproximadamente 4% das calorias vem da gordura e 2% das calorias vem da proteína. O milho é um alimento versátil e rico em nutrientes, tais como vitaminas do complexo B, vitamina E, minerais e fibras. A farinha de milho é apenas um entre vários exemplos do que podemos aproveitar dele. Uma xícara de farinha de milho fornece 8,9 gramas de fibra, ou seja, aproximadamente 36% da necessidade diária do nutriente para as mulheres e 23% para os homens.


“A farinha de mandioca, além de alimento indispensável para os cangaceiros, era utilizada como emplastro, ou seja, unguento, para tratamento de tumores. Muitos cangaceiros faziam a chamada cataplasma de farinha, que consistia em colocar a farinha de mandioca quente sobre as feridas dos cangaceiros lesados em combates.” (AM. 2015)


Rapadura

A rapadura é fonte de energia, carboidrato, minerais como ferro, cálcio, potássio, fósforo e magnésio, e vitaminas do complexo B como Tiamina, Riboflavina e Niacina. Tradicionalmente consumida pela população do Nordeste do Brasil, especialmente no sertão. “O produto, feito de mel de engenho dado certo ponto, algumas vezes também chamado de “raspadura” (palavra provinda do verbo raspar), originou-se das crostas de açúcar presas as paredes das tachas, durante a fabricação do mesmo, retiradas pela raspagem e moldadas como tijolos. Com o passar do tempo, recebeu alguns requintes como a adição de castanhas de caju, amendoim, cabeças-de-cravos e cascas de laranja.” (portalsaofrancisco.com)


Ainda hoje, todo sertanejo que se presa leva seu ‘taco’ de rapadura dentro do bisaco, bornal, e uma quartinha de barro ou mesmo uma cabaça com água para o roçado. Naquele tempo, os cangaceiros as levavam em seus bornais. Não podiam levar em quantidade elevada, pois iria ficar bastante pesado.


Queijo (de) Coalho

Com 330 calorias por porção de 100 gramas (ou 100 calorias por fatia de 30g), o queijo de coalho contém ainda 26 gramas de gordura e 19 gramas de proteína. “O queijo coalho, além de delicioso, é um alimento bastante saudável. O queijo é um produto lácteo concentrado composto a partir da coagulação do leite e é ingerido como parte da dieta humana há milhares de anos. Assim como o leite, o iogurte e outros produtos lácteos, o queijo coalho é certamente rico em muitos nutrientes, adicionando cálcio, fósforo, proteínas, vitaminas lipossolúveis e vitaminas B. O queijo coalho é um alimento que pode ser ingerido em qualquer hora do dia, em qualquer prato. Confira a seguir se realmente é saudável comer queijo coalho.” (remediodaterra.com)


O vaqueiro, o roceiro, o homem do sertão nordestino, normalmente, quando entrava nos bandos cangaceiros tinham em média 15 a 17 anos de idade, um pouco menos ou um pouco mais, com idade elevada a isso são poucas e raras as adesões, passando a partir daí a viver uma ‘maratona’ de corre, corre e esconde, esconde dentro da Mata Branca a procura de sobreviver as perseguições das volantes.


A alimentação citada acima era o que, normalmente, o agricultor nordestino comia no seu dia a dia. Porém, fazendo parte do cangaço, não tinha como eles terem o alimento diariamente. Muitas vezes tinham que comer frutas silvestres, cactáceas, xique-xique, coroa-de-frade, mandacaru etc., isso quanto encontravam e dava tempo retirar e comer e, raízes para sobreviverem, assim como usarem do líquido que continham as ‘batatas de umbu’, xilopódio encontrados nas raízes do umbuzeiro, a batata mamãozinho-de-veado*, que diferentemente do umbuzeiro, nessa é necessário arrancar a planta para retirar o xilopódio, para matarem a sede que os consumia. Normalmente depois de 10 ou 15 anos, quando não eram abatidos pelas volantes e/ou voluntários, começavam a ficarem com seus corpos sem energia e, sem estas, as doenças tomavam conta do corpo deixando-os sem tanta agilidade. Além disso, tinha os ferimentos a bala que, por mais simples que fossem, eram tratados de maneira incorreta e perigosa, deixando sequelas irreparáveis.

O próprio Virgolino foi ferido várias vezes e as consequências foram enormes, apesar dele ter sobrevivido por quase vinte anos nessa vida de bandoleiro, sendo abatido em julho de 1938 quando contava com seus 41 anos, idade considerada avançada.

*O mamãozinho-de-veado (Jacaratia corumbensis O. kuntze) é um pequeno arbusto que têm como raiz principal, um grande xilopódio que serve para alimentar os animais na seca. (imbubrasil.jex.com.br)

Referência:

“Raspando o Tacho – Comida e Cangaço – Relações etnogastronômicas entre nômades e sedentários nos sertões nordestinos (1922-1938)” – MARCENA, Adriano. 1ª edição. Recife, 2015.
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