Por Francisco de Paula Melo Aguiar
Não é nenhum favor o gestor
público de qualquer nível ou grau de governo ser ético em seus atos
administrativos. Não importa que tenha sido um gestor federal, estadual e ou
municipal. Se de um país de primeiro mundo e ou de um país de último mundo.
Alfabetizado ou iletrado.
Em lendo reportagens, livros,
revistas, jornais, assistindo filmes, etc., envolvendo as mais diversas
gestões que passaram pelo Palácio da
Redenção, sede do governo do
Estado da Paraíba, li e passo a transcrever na integra um testemunho de ética
administrativa do ex-presidente da Provincia [Estado] da Paraíba, nada mais,
nada menos do que José Teixeira de Vasconcellos e/ou José
[Francisco] Teixeira de Vasconcellos, o Barão de Maraú, homem de poucas letras e
senhor de engenho na várzea do Rio Paraíba.
Segue a transcrição de:
REMINISCÊNCIAS - F. Coutinho de
L. Moura.
UMA ADMINISTRAÇÃO FELIZ E
MORALIZADA.
Tem-se dito algures, com
autoridade firmada em factos históricos, que não teem sido
sempre felizes as administrações presididas por mentalidades
superiores, de grande saber e ilustração.
Dentre estas, muitas vezes,
vêm-se uns tantos casos de fracasso vergonhoso que acarretam
para a Nação verdadeiro descalabro financeiro e não
fosse, entre nós, os recursos phantásticos de que dispõe o
Brasil, á esta hora, talvez, já estaríamos sob o domínio
estrangeiro.
Ao contrário, entretanto, vemos
com admiração, administrações magnificas, bem equilibradas,
fecundas e de finanças bem organizadas, servidas por
mentalidades medíocres sem cultura, mas com um bom senso prático
invulgar e, realizadas dentro das normas da mais rigorosa moral,
como a de que vamos-nos
ocupar.
Refiro-me á administração do
inesquecível Barão de Maraú que, assumindo o exercício do cargo de
primeiro Magistrado da Provincia, na qualidade de 2º
Vice-Presidente, em 20 de abril de 1867 e conservando-se no Poder
até 1º de novembro do mesmo anno, em tão curto lapso de
tempo, realizou melhoramentos de vultos para a sua época, como
calçamento das principaes ruas da Capital e remodelação de serviços
públicos; tudo com muito critério e honestidade.
Para honrar a memoria de tão
conspícuo cidadão, refiro o seguinte facto que me foi dito
pelo meu saudoso amigo, Major Mariano Rodrigues Pinto,
empregado da Secretaria do Govêrno, na época em que alludo.
Sendo de pouca instrução o Barão
de Maraú, José Francisco Teixeira de Vasconcellos, senhor
de engenho rico da várzea da Parahyba, liberal e figura de
relevo do partido chefiado pelo comendador Felizardo Toscano,
investido do Poder, teve o bom senso de chamar para seu
secretario, um dos mais competentes e dignos funccionarios da
Secretaria do Govêrno, chamado João Francisco de Mello Barreto, na
intimidade (Joca Barreto), em quem depositava o presidente
merecida e absoluto confiança.
Um dia abriu-se uma vaga de
professor no Lyceu Parahybano. O secretario leva ao conhecimento
do Presidente o alludido facto
dizendo ser preciso abrir
concurso.
___ E o que é concurso, diz o
Barão?
___ É para saber-se qual dos
candidatos é o que sabe mais, informa o secretario.
___ E está nas lezes, pergunta o
Barão?
___ Sim, senhor Barão.
___ Entonce manda abrir concurso,
Barrette, diz o Barão.
No dia do concurso lá se achava,
no salão do Lyceu o Presidente com seu secretario e o
ajudante de ordens.
Enthusiasmado com o prélio, no
qual venceu um adversário do partido a que pertencia o Barão,
manda nomear o candidato victorioso no concurso.
Vendo o secretario Jôca Barreto
vendo que a nomeação ia desagradar ao chefe do partido a
que elle também pertencia, respeitosamente pondera ao
presidente que o candidato era do partido contrario.
___ Mas as lezes não mandam fazer
concurso para ver quem é que sabe mais, retruca o Barão?
___ Sim, senhor Barão.
___ Pois entonce o homem que
soube mais deve ser nomeado
como quer as lezes.
___ Mas...
___ Nada demais, nem menos,
Barrette, manda nomear o homem e deixa de história contra
as lezes.
___ Era inevitável. Manda
Barretto a nota para ser lavrada a nomeação na secretaria; e expede
uma ordenança com uma carta para o commendador Felizardo
Toscano, chefe do partido liberal, communicando o que estava para
acontecer.
In continenti, compareceu em
Palácio o chefe a quem o Barão comunica a resolução tomada.
Estás doido Zé Francisco, queres
escangalhar nossa política?
___ E as lezes não diz que o
homem que sabe mais deve ser nomeado?
___ Sim. Mas isto entende-se em
termos; mesmo porque não está positivamente dito que o
Presidente é obrigado a nomear o primeiro classificado. Ademais é
uma questão de puchar braza para nossa sardinha.
____ Ah! Entonce era para isto
que tú queria, me botar aqui.
Estás enganado, Felizardo. Toma
lá tua matrona (referia-se a cadeira presidencial que chamavam
de poltrona) eu vou-me embora para meu engenho.
Espantado com semelhante
resolução de um homem que não se amoldava ao que sua consciência
repellia e vendo o escandalo que seria esplorado pelo
adversário, Felizardo abraça o Barão e diz: faze lá o que entenderes e
não venha a zangar-te com teu velho amigo.
E venceram as lezes como dizia
aquelle inculto, mais dignissimo homem público. (A UNIÃO,
06/02/1937, p.3 e 7).
Um exemplo de homem público a ser
seguido ainda nos dias atuais
quando do exercício da coisa
pública.
Se bem que tal atitude aconteceu
ainda no século XIX, em plena Guerra do Brasil contra o Paraguai,
ainda no tempo da escravidão em nossos engenhos, vilas, povoados e
cidades.
A lição que fica de tal exemplo
tendo como ator e autor o Barão de Maraú, homem considerado iletrado
é que a ética tem como vinculo cumprir e fazer cumprir as leis existentes
em qualquer esfera de Poder.
Enviado pelo autor
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