Por: José Cícero
Festa de
abertura do Cariri Cangaço em Aurora
Quão
lisonjeiro e gratificante é a doce experiência de se viver toda a emoção de,
literalmente termos mergulhados no fundo da história destes sertões do mundo.
Principalmente em meio a uma sensação de alegria e contentamento quase
descomunal, numa sinergia coletiva entre aqueles que procuram o tempo todo
viver e sentir os fatos históricos na sua compleição mais forte e verdadeira,
quase como uma profissão de fé.
Na sua grande
maioria, pesquisadores, escritores e historiadores deveras apaixonados que são
pela temática dos sertões e, em particular, do fenômeno do cangaço desde a sua
gênese. Tendo como pano de fundo, o papel exercido pela ínclita figura de
Virgulino Ferreira da Silva - O Lampião, rei do cangaço e os seus comandados,
além de coronéis, beatos, jagunços, coiteiros e volantes.
Uma grande
multidão de aficionados, dos mais diversos e distantes rincões do Nordeste
(quando de outras partes do Brasil e do mundo) reunidos em torno de um tema no
mais das vezes, recorrente e por demais palpitante. Movidos todos eles, pelo
combustível incontrolável da curiosidade, da leitura e da pesquisa como um
farol sempre a serviço da verdade e da ciência social. Uma multidão de
abnegados pesquisadores, cuja paixão pela história lampiônica é quase uma marca
indelével, notadamente na visão dos que desejam sempre quere aprender um pouco
mais.
José
Cícero recepcionando o Conselho do Cariri Cangaço em Aurora
Um considerável
ingrediente que há muito tem fomentado a produção de conhecimento, chamando a
sociedade (em especial a acadêmica) a pensar e se debruçar sobre toda uma série
de questões a partir do enfoque do cangaço e seus desdobramentos. E, é bom que
se diga, o Cariri Cangaço tem jogado um papel de destaque neste processo. Assim
como outros eventos do mesmo naipe, que ora acontecem em outras paragens do
Nordeste e pelo País afora.
Quem sabe,
como uma profunda cicatriz deixada na própria pele (destes sertanejos
curiosos), por espinhos de antigos mandacarus durante as inumeráveis andanças e
incursões pelas inóspitas caatingas nordestinas.
Uma declaração
de guerra em favor do bem. O bom combate anunciado como que por meio de
medievais trombetas sertanejas, sobre os chapadões destes grotões caririenses.
Uma sensação de alegria sem tamanho, estampada nos olhos, bem como no peito de
todos estes verdadeiros vaqueiros visionários de uma saga sem fim, chamada
cangaço.
Cariri Cangaço
visita o Caldeirão do Beato Zé Lourenço
Pulsão de
quase morte a nos impulsionar às andanças e à pesquisa, buscando conhecer um
pouco mais daquilo que, de fato, aconteceu um dia neste sagrado chão e pelas
bibocas desconhecidas de uma elite ainda hoje preconceituosa.
Sem dúvidas,
num gesto da mais evidente ousadia dos que, ainda não se deram por satisfeito
diante da mentira de uma história descrita e escrita pelos vencedores. E assim,
decidem por si mesmos, ir além. Muito além da versão daquilo que há muito se
convencionou a chamar de história oficial.
Diante de todo
este incomensurável contentamento e disposição para este mergulho profundo e
perigoso na história, ficamos a nos perguntar: Que força e que energia (talvez
sobrenatural) nos impulsionam a esta grandiosa empreitada? Que motivação será
tão forte, a ponto de fazer com que homens e mulheres das mais diferentes
classes, profissões, idades, concepções, crenças e lócus geográficos;
desconhecendo distâncias venham se compor como num verdadeiro exército de
desbravadores pós-modernos ansiando ver de perto os nossos sertões hodiernos? A
face cruel da história. Os resquícios do passado que sobreviveu a toda
escuridão tenebrosa dos anos idos...
Que argamassa
inquebrantável possui a fantástico história do cangaço ainda hoje, ao ponto de
mexer o mais profundamente possível com todos nós pesquisadores e entusiastas
desta temática?
Será que, como
dizem os opositores, estamos implicitamente a enaltecer bandidos? Não. Isso
não.
O que estamos
na verdade, ao meu juízo, é lançando um novo olhar justo, preciso e necessário
sobre a fenomenologia dos acontecimentos que, por mais de cem anos, impregnou
os sertões e a sua gente de grandes percalços, marcados pela miséria e pela
injustiça de toda sorte.
Independentemente,
portanto, de enxergarmos (por exemplo) Lampião, quer seja como herói ou como
bandido - o cangaço por seu turno, como um fenômeno eminentemente social e
político, deixou sua marca na historiografia de todo o interior nordestino. E
Virgulino Ferreira, o Lampião, quer queira ou quer não, foi o seu protagonista
maior. De tal maneira que não poderá passar despercebido neste estudo de casos
e acontecimentos. É fundamental que conheçamos nossa verdadeira história...
Como de resto,
é mister que se diga que, só após as estripulias de Lampião com seu bando, foi
que o sertão ´passou´ a ser visto de uma outra maneira pelos poderes do
litoral. Contudo, parte daquela antiga realidade ainda persiste, vez que a
ótica dos poderosos também permanece tal qual como no passado: míope,
excludente, injusta, massacrante, discriminante e mentirosa.
José Cícero
Professor e
pesquisador do cangaço
Fonte:http://diariodonordeste.globo.com
http://cariricangaco.blogspot.com
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