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sexta-feira, 28 de abril de 2017

A FARMACOPEIA UTILIZADA PELOS CANGACEIROS


Refletir sobre os modos de cura que estavam presentes no cotidiano do cangaço é lançar novos olhares sobre esta temática que fora abordada ao longo da historiografia, a partir do viés marxista que retratava o cangaceiro de uma forma dicotômica, ora como bandido, ora como herói. 
    
A análise dos modos que os discursos e ritos de cura foram elaborados pelos participantes do cangaço nos possibilita enxergar suas práticas cotidianas bem como suas estratégias de sobrevivência. Os cangaceiros burlavam os conhecimentos médico-higienistas de sua época e recorrendo a mezinhas, chás, orações aos santos e a produtos naturais, criaram uma farmacopeia regional, onde os espaços de cura eram recriados e os saberes populares subjetivados na geografia do cangaço.
Pensar o cangaço como um lugar de invenção da cura, situa o corpo do cangaceiro como depositário de signos sociais, e nos leva a compreendê-lo como constituído e modelado pela cultura em que está inserido.

A Medicina do Cangaço:
    
Em "Lampião: A Medicina e o Cangaço", o autor Aglaê de Oliveira menciona alguns dos procedimentos utilizados pelos cangaceiros em seus cuidados com o corpo: 

Cefaleia: Folhas de algodão aquecidas e mascar o gengibre. 
Faringite: Chá de formiga e gargarejo com sal. 
Doenças reumáticas: Banha de capivara, chá de osso de jumento, carne de cascavel. 
Otites com leucorreia: Banha de traíra. 
Asma: Banha de ema. 
Constipação: Alecrim caseiro. 
Sinusite: Alecrim salobro. 
Diabetes: Jucá. 
Epistaxe: Cheirar algodão queimado. 
Otalgia: Tampões de folhas de algodão. 
Entorses e luxação: Emplastro de clara de ovo batida com breu e untar o local atingido, 
com banha de ema. 
Mordedura de cobra: Queimava o local da picada imediatamente ou realizavam um 
corte com faca afiada para escorrer o veneno. 
Halitose: Mastigar folhas da goiabeira branca. 
Hemorragia: Suco de arnica. 
Cardiopatias e lipotimia: Chá de quiabo. 
Epilepsia: Chá de perna de garça. 
Ascaridíase: Erva de cruz. 
Difteria: Banhos de sândalo e alcaçuz. 
Hidrocele e hérnia: Banha de baiacu. 
Enterites: Chá de erva cidreira, sarpinanga.
Escabiose: Raspa de coco misturada mistura com enxofre, passando 8 dias sem molhar.
Verminoses: Lavagem de manipueira.
Impotência sexual: Chá de velame, chá de cabeça de negro em jejum e água de arroz. À
pimenta e ao caminho em jejum chamavam “mingau levanta homem”.
Para suspender a menstruação: Semente de mangiroba em infusão. Infusão de grão e
café na aguardente, durante 9 dias.
Febre alta: Suador de semente de melancia e a casca de angico em água serenada.
“Fraqueza dos pulmões”: Leite de jumento pela manhã.
Prisão de ventre: Chá de raiz da jitirana, retirada do nascente. 

A farmacopeia dos bandos era constituída por remédios feitos tanto a partir do saber popular como das crenças e valores dos indivíduos. A junção de chás, lambedores, emplastros, acompanhados de rezas e orações, estão presentes nas práticas do cangaço, como por exemplo, o ritual para curar-se do vício da cachaça: cinco gotas de Jurema do Pará deveriam ser colocadas na bebida sem que o viciado soubesse. Essa prática deveria ser repetida por três sextas-feiras. 

A intenção era que o viciado ao beber, vomitasse e aborrecesse a bebida, a prática deveria ser acompanhada da seguinte oração:  

"Oh! Divino Redentor
Quando fulano beber
Êle há de se enjoar
A bebida há de feder.

Meu senhor, Meu Jesus Cristo,
Minha Santa Virgem Maria
Valei-me Padrinho Cícero
E a Sagrada Família.

Com a santa fôrça do credo
E o vosso santo poder
Tu hás de sentir a bebida
Nas tuas ventas feder."       

Os sujeitos do cangaço elaboraram táticas e estratégias para sobreviver as adversidades do cotidiano, como as doenças, a dor e principalmente a morte. Lampião assim como outros cangaceiros trazia em seu corpo as marcas da violência e das adversidades da vida de bandidagem. 

Cópia de foto original encontrada no bornal de Lampião. A foto está arquivada no Instituto Histórico e Geográfico de Maceió. Acredita-se que a mesma tenha sido feita pelo árabe Benjamin Abrahão, entre 1936/37. (Fonte: http://lampiaoaceso.blogspot.com/search/label/A%20medicina

Dentre os diversos tiroteios que presenciou, Lampião foi ferido em diferentes partes do corpo: “Foi ferido à bala no ombro e na virilha, no município de Conceição do Piancó, Paraíba, em 1921; em 1922, o foi na cabeça; em 1924, no dorso e no pé direito, em Serrado Catolé, Pernambuco. Outros ferimentos também tatuaram seu corpo –em 1926, na omoplata; em 1930, no quadril.” ( Buriti Oliveira, 2011, p.10).

Essas entre outras marcas de dor e ferimentos se faziam presente cotidiano dos sujeitos do cangaço, que com suas crenças e valores driblavam os discursos médicos lançando mão de práticas de viver e de agir para sobreviver às adversidades do cotidiano.

http://cangacoartesdacura.blogspot.com.br/p/inicio.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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