*Rangel Alves da Costa
Parece que nossos espelhos pouco ou quase enxergam ou fingem enxergar. Nossos sentimentos ainda vivem nas ilusões de quem somos muito além do que realmente somos. A verdade é que vivemos de fingimentos, de hipocrisias, de irrealidades. Somos os disfarces ocultando as verdades, somos apenas as aparências daquilo que verdadeiramente não somos.
Somos tão imperfeitos que não reconhecemos nossas imperfeições. Insistimos em aceitar o que não somos simplesmente para satisfazer os egoísmos, as vaidades, as soberbas, as pessoais arrogâncias. Não queremos o que realmente somos por medo de que a humildade passe a ideia de humildade e o humanismo passe a aparentar fragilidade. E então, longe as sensibilidades, os humanismos, os afetos e as simplicidades.
Em nós, assim tão humanos, o corpo sendo renegado pelo brilho da roupa que o reveste. Em nós, assim tão racionais, a irracionalidade de agir perante as conveniências e a impetuosidade de ser aquilo que não nos cabe ser. Em nós, assim tão presumidamente inteligentes, as reincidências em erros, os fazeres contraditórios ao próprio desejo da alma, os impulsos perante tudo aquilo que exige comedimento. O que somos, então, senão as mais perfeitas imperfeições?
Somente o próprio reconhecimento das imperfeições é que nos tornam aproximados da perfeição. Apenas aproximados. O restante é tudo imperfeito em nós. Queremos sonhar com o impossível e sempre desejamos tudo o que seja impossibilidade. E o possível é relegado pela facilidade. Assim em tudo e em todos. Erram os sábios e erram os filósofos, erram o rei e a plebe. Não há ninguém na face da terra que sequer se aproxime da perfeição. Todos nós erramos, todos nós agimos erroneamente, todos nós apenas buscamos errar menos.
Diante disso algumas lições. Não posso criticar um erro no próximo em nome de uma perfeição que sequer possuo. Não posso dizer que o outro fez assim quando deveria agir de outro modo, se eu mesmo duvido do acerto naquilo que faço. Imaginam que escrevo bem, corretamente, mas ledo engano de quem pensar assim. Gramaticalmente, minha grafia é cheia de imperfeições. E por que eu posso criticar o modo como algumas pessoas escrevem aqui nas redes sociais ou nos seus cadernos?
Criticar gratuitamente jamais. Nem posso nem devo. Ora, se eu tenho formação de nível superior e ainda assim escrevo errado, então por que cobrar correção linguística e gramatical em muitos que sequer concluíram outros níveis de ensino? Ademais, língua é liberdade, é pássaro, é voo. Escrevam certo ou errado, mas escrevam aquilo que lhes vem como certo. Assim por que muito comum que determinadas pessoas façam da fala ou da escrita uma manifestação de superioridade, como se os iletrados ou analfabetos forem pessoas menores ou devessem ser desrespeitadas pelo seu nível cultural ou educacional.
Não posso nem devo caçoar nem da fala nem do jeito de falar de ninguém. Há que se respeitar também a cultura e o linguajar de cada um. Basta que passe a ideia e ela seja entendida de algum modo, então a mensagem já terá alcançado seu objetivo. Igualmente serve para o seu time de futebol, sua roupa, a canção que gosta de ouvir e o tipo de vida que gosta de levar. Há, repito, que respeitar as liberdades. E pelo simples fato de que absolutamente ninguém é perfeito. Do contrário também a vida não teria valia alguma, pois a cada passo ela está nos ensinando a ser menos imperfeitos. Daí o valor da humildade.
Ser humilde ajuda em muito moldar as imperfeições. Quem preza pela humildade não se fere tanto ao ter que meditar e reconhecer seus erros. Ser humilde é dialogar com a realidade de modo a não se afastar do mundo real. E neste mundo reconhecer aquela antiga verdade dizendo que nada mais somos que a arrogante pedra que vai se tornar pó. E como pó esvoaçar para o sempre até mesmo as perfeições.
Escritor
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