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quarta-feira, 7 de novembro de 2018

SEIS ANOS SEM ALCINO (MAS ALCINO VIVE)

*Rangel Alves da Costa

Quando ao entardecer do dia 1º de novembro de 2012, Alcino Alves Costa se despediu da vida terrena, o seu Poço Redondo e todo o sertão emudeceram entristecidos, silenciaram em prantos, lamentaram a dor da partida daquele que simbolizava a própria vivência sertaneja. E tudo através de seu amor pela terra, seus estudos e escritos sobre os sertões, seus versos e prosas cantando a vida matuta, a singeleza do viver sertanejo, as passaradas em revoada pelos horizontes ensolarados ou de chamas acesas ao por do sol.
Foram 72 anos vividos, mas quase de uma eternidade pelo que semeou, brotou e colheu. Nascido em 1940, dois anos após o fim do cangaço com o massacre da Gruta do Angico, ali mesmo no seu Poço Redondo, mais tarde Alcino seria reconhecido como um dos maiores estudiosos do tema, pontificando pelos livros escritos e como palestrante sempre requisitado e aplaudido. Participou da fundação do Cariri Cangaço – entidade de estudo de fenômenos históricos, sociológicos e culturais nordestinos – e hoje dá nome ao seu Conselho Curador.
De rara inteligência, com agudeza de pensamento sem igual, não possuía, contudo, formação acadêmica alguma. Na verdade, estudou somente até o quarto ano primário, depois abdicando da vida escolar para aprender outras lições nos livros do mundo. E como Alcino aprendeu! E como Alcino ensinou! Rapazote, logo se tornou exator no fisco estadual. Mas demorou muito e a política partidária atraiu às suas hostes o sertanejo filho de Dona Emeliana e Seu Ermerindo. E aos 26 anos foi eleito prefeito de seu berço natal.
Durante três gestões Alcino comandou os destinos de Poço Redondo. Destas passagens, ainda hoje se comenta sobre sua aversão a sapatos, a ternos, aos luxos de um administrador municipal. Nunca se deu bem com sapatos nem com paletós e gravatás. Calçava um sapato somente quando ia ao palácio governamental, mas só faltava trocá-lo por havaianas logo após a porta dos gabinetes. Só se sentia bem, só se sentia com vida, cortando as ruas e as estradas do seu sertão tendo nos pés as suas inseparáveis havaianas.
A política, contudo, não foi a sua grande paixão. O sertão, sim. O sertão foi a grande seiva e o sopro maior na vida de Alcino. E através do amor pelo sertão a busca maior pela sua história, pelas suas raízes, pela sua cultura, pela sua saga de vinditas sem fim. Por isso mesmo que se tornou poeta das coisas matutas, escritor do mundo-sertão, pesquisador de suas raízes mais profundas, um verdadeiro menestrel daquilo que mais amou: o sertão e seu povo, o sertão e sua luta, o sertão e sua guerra. Daí também seu amor pelo estudo do cangaço.
Foi através do estudo do cangaço que o seu nome ultrapassou fronteiras. Seu livro “Lampião Além da Versão – Mentiras e Mistérios de Angico” é hoje tido como obra-prima e de referência necessária ao estudo dos fenômenos cangaceiros. Mas escreveu muito mais: “O Sertão de Lampião”, “Lampião em Sergipe”, “Poço Redondo - A Saga de um Povo”, “Canindé de São Francisco - Seu Povo e sua História”, “Sertão, Viola e Amor”, “Saudação a Paulo Gastão”, “Preces ao Velho Chico” e o romance “Maria do Sertão”. Como compositor, letras suas foram gravadas por Clemilda, Dino Franco e Mouraí e muitas outras duplas sertanejas. Era também apresentador de programa radiofônico
Desde 2013 que a memória histórico-literária de Alcino está preservada num memorial que leva o seu nome na cidade de Poço Redondo. Seu nome continua vivo nas pessoas do seu sertão, mas principalmente em regiões mais além. Com efeito, todo o Nordeste e além-fronteiras reconhece e valoriza a obra daquele que sempre gostava de assinar seus artigos como “O Vaqueiro da História”. Essa força de permanência de Alcino foi assim retratada pelo poeta cordelista Manoel Belarmino, também de Poço Redondo, em estrofes assim:

“Alcino cravou raízes
Nestas terras catingueiras
No Sertão do São Francisco
Dos vaqueiros, das rendeiras,
Do cangaço, dos romeiros,
Das rezas das benzedeiras

Aqui no Poço Redondo
Escreveu com maestria
A saga de seu povo,
A vida no dia a dia,
A nossa história viva,
Nossa luta e valentia.

Um homem de coração
E de grande devoção
Que conseguiu abrigar
Com muito amor e paixão
Bem no fundo do seu peito
Todo esse imenso sertão.

Alcino desde menino
Sempre teve graça e glória
Homens assim nunca morrem,
Ficam vivos na memória,
Pois nunca se viu morrer
Um Vaqueiro da História”.

Ainda hoje, é como se aquelas havaianas estivessem cortando os chãos sertanejos e o seu dono, sempre no seu passo sem pressa, seguindo em busca de antigos testemunhos ou simplesmente em direção a qualquer banco da Praça da Matriz para refletir sobre o seu sertão e mirar os horizontes. E no seu olhar as craibeiras floridas e os anjos sertanejos tocando pífanos.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

http://bogdomendesemendes.blogspot.com

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