Jose Tavares
de Araújo Neto
O ano era
1928. Noite de 28 de outubro. Enfim, havia chegado o dia do prefeito Francisco
de Sá Cavalcante entregar à população de Pombal o tão propalado motor de luz
elétrica, que iria garantir, em curto prazo, a eliminação definitiva da
precária e limitada iluminação pública feita através de lampiões a querosene.
Para tanto, o prefeito Sá Cavalcante havia adquirido um moderno gerador de
energia elétrica, movido a óleo diesel, uma revolucionária tecnologia que
garantia aposentar os velhos motores a vapor. “O primeiro com esta tecnologia a
chegar na Paraíba. Das poucas cidades do Estado que dispõe de luz elétrica, em
todas, o motor gerador é movido a vapor”, dizia orgulhosamente o prefeito.
Em 1927 o prefeito Sá
Cavalcanti, instala a luz elétrica em Pombal. O motor internacional era movido
a óleo diesel. A inauguração foi um grande acontecimento e marcou época, com
fotografias, festas e desfile da banda de música pelas principais ruas da cidade.
Lembro que antes da energia elétrica, toda sociedade pombalense era nivelada
por uma iluminação a bico de lamparinas, candeeiros, velas e lampiões. Na foto,
o prefeito de gravata borboleta é Sá Cavalcanti, e Hermínio Monteiro, de
chapéu, foi responsável pela manutenção e gerenciamento de todo o sistema
elétrico.
Créditos: Texto e Foto dos arquivista de Verneck Abrantes de Sousa
Créditos: Texto e Foto dos arquivista de Verneck Abrantes de Sousa
O possante e
barulhento gerador foi abrigado na casa das máquinas, denominada “Estação de
Luz Municipal”, imóvel onde hoje está instalada a Câmara Municipal de Pombal.
Nas principais vias das cidades, em locais estratégicos, foram implantados
alguns postes de madeira, para receber as instalações elétricas e as lâmpadas
para a iluminação pública. A grande inauguração da energia elétrica atraiu uma
verdadeira multidão às ruas da cidade de Pombal, só vista durante a Festa do
Rosário, o mais tradicional evento religioso da cidade, que havia ocorrido há
apenas doze dias atrás. Seria uma festa para entrar para história.
Casa
construída pelo prefeito Sa Cavalcante exclusivamente para abrigar o Motor
Gerador de Energia Elétrica. - Foto: Arquivo de Verneck
Abrantes de Sousa
Dentre os que
integravam essa massa humana presente ao grande evento, encontravam-se dois
destacados cidadãos da sociedade pombalenses: os senhores Noé de Seixas Gadelha
e Lindolfo Vicente de Paula Leite Júnior que, no melhor estilo da aristocracia
algodoeira, trajavam ternos de linho e portavam vistosas bengalas. Naqueles
anos, nos eventos sociais, o homem na moda sempre segurava uma bengala ou um
guarda-chuva fechado como sinal de elegância, poder e autoridade masculina.
1928.
Um Poste de Madeira na via pública da cidade de Pombal marca a expansão da
energia elétrica (movida a óleo diesel) com horas marcadas para acender e
apagar suas luzes. O Poste estava por trás da antiga Rua Nova, hoje Rua Padre
Amâncio Leite. - Créditos: Texto e foto do arquivo de Verneck
Abrantes de Sousa
Noé, irmão de
José de Seixas Gadelha, o delegado da cidade, era um excelente flandeiro,
denominação que a época se dava ao profissional que trabalhava com flandres;
funileiro. Era ele mesmo quem comercializava os utensílios que fabricava; a
exemplo de canecos, baldes, latões, chaleiras, e principalmente lamparinas (ou
candeeiro), o mais popular dispositivo para iluminação artificial de uso
doméstico, que consistia em um pequeno recipiente em forma piramidal,
abastecido por querosene que umedecia um pavio feito de algodão, em cuja
extremidade externa se colocava fogo para gerar a iluminação do ambiente.
Igreja
Matriz com apenas uma torre. - Foto: Arquivo de Verneck
Abrantes de Sousa
Lindolfinho
era filho de Capitão Lindolfo Leite, abastado fazendeiro, herdeiro único do seu
tio Padre Amâncio Leite, que lhe deixou de herança as fazendas Várzea Comprida
dos Leite, José Rodrigues e Pedra D’água, esta última deu origem ao município
de Condado/PB. Além do nome, Lindolfinho herdou do pai parte da Fazenda Pedra
D’água e o seu temperamento forte, autoritário e truculento. Um dos irmãos de Lindolfinho,
Vicente de Paula Leite, conhecido por Major Sinhô, foi o fundador, neste mesmo
ano de 1928, do Itajay Futebol Clube, primeiro time de futebol, cujo campo de
futebol era em frente a sua residência, onde hoje se localiza a Praça do
Centenário. Capitão Lindolfo e seu filho Major Sinhô exerceram o cargo de
subprefeito de Pombal, sendo que o ultimo chegou a assumir temporariamente o
cargo de Prefeito.
Lamparina
ou Candeeiro, antes da Luz elétrica era o equipamento de iluminação artificial
mais popular nas residências dos sertanejos.
Havia entre o
flandeiro Noé e o fazendeiro Lindolfinho um recíproco sentimento de repulsa,
que eles não faziam a mínima questão de esconder de ninguém. A verdadeira
motivação do surgimento da inimizade entre ambos se perdeu no tempo, ninguém
lembrava o porquê, no entanto, todos sabiam que no sertão essas questões, por
menores que pareçam, geralmente não terminam bem. Era um barril de pólvora
prestes a explodir a qualquer momento.
Capitão
Lindolfo, fazendeiro, ex-delegado e ex-subprefeito de Pombal, pai de
Limdolfinho e de Major Sinhô. - Foto: Arquivo da família.
Hora da
inauguração. Noite escura. Após a ligação do motor gerador, luzes acesas,
palmas e vivas, discursos, mais palmas e vivas. A multidão caminhou em
procissão em direção a Igreja Matriz, na época apenas com uma torre, a fim de
assistir a missa em ação de graça, celebrada pelo padre Valeriano Pereira de
Sousa, chamado carinhosamente pelos fiéis de “Padrinho Vigário”.
Padre
Amâncio Leite, ex-pároco de Pombal e deputado provincial por três legislatura
deixou sua fortuna para o sobrinho Lindolfo Leite.
Após a missa,
na pracinha da cidade, em frente a matriz, acontecia a retreta da Filarmônica
Municipal, sob a regência do maestro Francisco Ribeiro, que, anos mais tarde,
compôs em parceria com Newton Seixas o belo hino da cidade de Pombal. A
multidão se acotovelava em torno da banda, que, sob aplausos, apresentava antigos
e inéditos dobrados, compostos pelo maestro especialmente para a data festiva.
ITAJAY
FUTEBOL CLUBE. O primeiro time organizado de Pombal, em 1928, pelo fazendeiro,
Vicente de Paula Leite. O campo de futebol era onde hoje é o Bar Centenário.
Formação da Esq./Dir. 1- Toinho de Dr. Ireneu; 2- Chateaubriand Pereira; 3-
(?); 4- Dr.. Benedito; 5- Rosil Guedes; 6- Neuzinho, irmão de Dr. Jeferson; 7-
Luiz Vieira; 8- Edson de Manoel Honório; 9- Toinho de Dona Querubina; 10-
Toinho de Dona Anália; 11- Zé Campina. 12- Goleiro (?). - Fonte: Verneck Abrantes
Foto: Acervo de Verneck Abrantes
Foto: Acervo de Verneck Abrantes
Tudo corria
muito bem até o momento em que na tentativa de melhor visualizar a apresentação
da banda, os dois inimigos se esbarraram. Ao se reconhecem, olharam-se com cara
de ódio e desprezo, iniciando uma rápida troca de agressões verbais e logo em
seguida partindo às vias de fatos, através de troca de bengaladas.
No
o espaço antes utilizado como campo de futebol, o prefeito Sá Cavalcante
construiu a Estação da Luz, destinado a abrigará o motor a óleo, gerador de
energia elétrica. Depois este imóvel foi reformado para funcional a Prefeitura,
depois e até os dias de hoje funciona a Câmara de Vereadores. Localizada na Rua
Coronel José Avelino-Centro. - Créditos: Texto e foto dos arquivos de Verneck
Abrantes de Sousa
A confusão
gerou um grande tumulto no local, chamando a atenção dos que se encontravam um
pouco mais distante, a exemplo de Jose Gadelha, delegado da cidade, que na
intenção de manter ordem, às pressas, dirigiu-se ao local do embate.
Entretanto, quando percebeu a aproximação do irmão do seu inimigo, Lindolfinho
sacou da cintura uma arma e desferiu um tiro contra o delegado, que caiu
imobilizado sob o chão. Ato contínuo, Noé sacou de sua arma e disparou quatro
tiros certeiros contra o agressor do seu irmão, pondo fim instantaneamente a
vida de Lindolfinho, no vigor dos seus 37 anos de idade. No meio do tumulto, Noé
evadiu-se do local, tomando rumo ignorado.
Francisco
de Sá Cavalcanti foi o primeiro Prefeito de Pombal eleito diretamente pelo
povo, sua administração destaca-se pela eficiência do seu trabalho e a
honestidade com que tratava o dinheiro público. Quando da sua primeira
administração, em 1927, instala a 1ª Empresa de Luz (a diesel) de Pombal, na
época a única cidade do sertão paraibano contemplada com tal benefício. Na
administração iniciada em 1936, constrói o Coreto e a Praça Rio Branco, hoje,
denominado de Bar Centenário e Praça José Queiroga. Edifica a Coluna da Hora,
constrói a Praça Getúlio Vargas, o Açougue Público, inaugura a usina de luz do
então distrito de Malta, são criadas várias escolas do ensino primário e o
Código de Postura Municipal. Determinou, em Decreto Lei, e depois oficializado pelo
Estado, os limites de Pombal com outros Municípios, fez aquisição de um terreno
e instalou um horto florestal para educação agrícola e arborização da cidade,
entre outros trabalhos na sede e nos distritos. Em se tratando de investimento
pelo Governo Estadual, destaca-se a construção da Ponte do Areal sobre o rio
Piranhas, concluída em 1939. Sá Cavalcanti casou-se com Mirinha Queiroga no dia 24 de julho de 1923, ela com
14 anos de idade e ele com 27. Ele faleceu em 19/02/1968, com 72 anos de idade.
Quando consideramos os investimentos estruturais e urbanísticos da cidade, ele
mantém a insígnia do melhor Prefeito de Pombal. - Créditos: Texto e foto do arquivo de Verneck Abrantes
Assim, com um
saldo de um morto e um ferido, as festividades em comemoração à chegada da luz
elétrica em Pombal, ocorridas naquela noite de 18 de outubro de 1928, foram
ofuscadas por cenas de sangue que abalaram a sociedade da região, deixando uma
indelével cicatriz na história da cidade.
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