Seguidores

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O deleite de Volta Seca - O Pasquim encosta na parede O "Jésse James" do nordeste . Parte I


Quando a estrada chegou ao Sertão um tipo de banditismo e rebelião estava fadado a desaparecer. O cangaço morreu de morte natural, substituído por outros tipos mais sofisticados de rebelião e assim vai a vida e assim todo o mundo e a Lusitânia. Alguns homens, poucos, sobraram para contar a história. Entre eles a figura pequena, frágil e ainda perplexa de Volta Seca, que matou pela primeira vez aos 10 anos, entrou para o bando de Lampião aos 11 e foi preso e condenado à prisão perpétua (minto, há 145 anos) aos 14. Aqui está ele, entrevistado pelos cabras D'o pasquim, lembrando a dor, a injustiça, a luta contra a morte dia a dia, revivendo as angústias do Sertão na paz de uma casa em Santa Cruz (zona rural do Rio), cercado pela mulher e pelos 13 filhos. (Millôr) 

Millôr - Nós estamos aqui com o maior entusiasmo para entrevistar Volta Seca, uma das figuras históricas do movimento de rebeldia do início do século, no Norte do País. Volta Seca, você nasceu no Sergipe, em que ano, hein?

- Eu nasci em 1918, dia 13 de março.  

Millôr - Você entrou para o bando de Lampião com que idade?
- 11 anos.
 

Millôr - Qual foi o motivo principal que levou você a entrar no bando de Lampião?

- Foi quando eu perdi minha mãe. Meu pai, depois de uns seis meses, mais ou menos, arranjou ama dona e botou dentro de casa. E essa dona, então, queria maltratar as minhas irmãs... 

Jaguar - Vocês eram quantos em casa?

- Nós, em casa, era doze.   

Ziraldo - Então você ganhou de seu pai.

- Ganhei!?  

Ziraldo - Você tem 13 filhos. né? Quer dizer que você ganhou de seu pai de 13 a 12, né?

- Ganhei, então. Bom, eu achei que aquilo não estava correndo ama coisa certa. Porque, para bater nos filhos, só mesmo os pais... Ela pegou um tamanco e jogou na cara da minha irmã. Eu não gostei. Aí, eu fui pra falar com ela e ela achou que tava ruim. Aí eu peguei o tamanco e joguei na cara dela também. E daí eu dei o fora. 

Ziraldo - Sua mãe morreu de quê?

- Minha mãe morreu doente na cama mesmo.

 Millôr - Que profissão tinha o seu pai?

- Meu pai era lavrador.

Millôr - Ele tinha alguma terra?

- Tinha muita terra, tinha muita terra, mas foi indo... homem casado duas vezes, né? Então... ele também morreu, já bem velhinho. 

Millôr - Vocês viviam bem enquanto ele estava vivo?

- Bem, multo bem. Nós vivia bem mesmo. Nunca passamos necessidade nenhuma. Mas no dia que a minha mãe morreu... Desse dia, acabou tudo...

Millôr - Você já tinha escola com 11 anos?

- Nunca tive nada. Nada... 

Millôr - Você hoje sabe ler e escrever?

Não. O que eu sei apenas é assinar meu nome. E alguma bobagenzinha assim... 

Jaguar - Fazer conta, cê sabe?

- Conta? Ora, com efeito. 

Millôr - Aí você saiu pelo mundo e foi para onde? Pra Aracaju?

Não, eu saí pelo mundo sem destino. 

Ziraldo - Você fugiu de casa?

- Perfeito. 

Millôr - Você morava a que distância de Aracaju?

- A seis léguas. Em Itabaiana Grande. 

Millôr - Você saiu a pé, levou algum dinheiro, alguma coisa?

- Nada, nada. Só a roupa do corpo. 

Millôr - E comia, e vivia, como?

- Eu chegava naquelas fazendas e eles me davam comida. Eu procurava um dia de trabalho, ia trabalhar. Mas o trabalho era muito pesado, num dava pra mim. Eles arrumavam pra eu vender doce. No fim não me pagavam também, dizia que o trabalho que eu fazia de vender doce era somente pra comida. Adespois, eu saí pelo mundo sem destino. porque não tinha ninguém por mim. Só Deus. O velho, depois, mesmo cansado, viu que tava errado e foi em busca de mim. Mas, eu nem quis voltar mais. 

Ziraldo - O seu pai chegou a te chamar, a conversar com você?

- Uns dois anos depois ele me achou. Eu estava em Cemandiase. 

Jaguar - Ainda tava trabalhando de biscates?

- Não, eu já andava carregando água em animal, para me manter. Ganhava dois tostões por dia, três tostões. E sempre me virando. 

Ziraldo - Você ai, tinha onze anos.

- Não, ai eu tinha menos. Eu saí de casa quando tinha nove anos. 

Millôr - Você entrou para o bando em 1929. Lampião já era famoso, tinha mais de 10 anos de cangaço, e já era o terror de todo aquele lugar.

- Ele era conhecido por todo mundo. Mas eu mesmo não conhecia ele.  

Millôr - Mas você já tinha ouvido falar, né?

- Ouvia falar que existia aquele homem e tal, com aquela turma toda...
Millôr - O lugar em que você vivia, não era aterrorizado por Lampião?


- Não. Nem nunca foi lá; Eles não sabia, de nada disso. 

Na próxima postagem: "Irmã de Volta Seca é abusada sexualmente e  Volta Seca vinga".

Um abraço a todos, e valeu pela atenção

Ivanildo Silveira
Colecionador do cangaço
Membro da SBEC


http://lampiaoaceso.blogspot.com.br
http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Um comentário:

  1. Anônimo12:02:00

    Ok professor Mendes, ótima entrevista esta com o MENINO VOLTA SECA. Muito melhor ainda na continuidade da postagem.
    Abraços,
    Antonio Oliveira - Serrinha

    ResponderExcluir