Por Bruno Barreto
O dia 19 de
junho de 1927 foi importantíssimo na história do Jornal O Mossoroense e de toda
a imprensa potiguar, pois foi neste dia que foi publicado o maior furo de
reportagem do Estado. Tratava-se da entrevista que o cangaceiro Jararaca
concedeu a Lauro da Escóssia na prisão, antes mesmo de depor em inquérito
policial.
O cangaceiro Jararaca
Com a
reportagem, de repercussão nacional, transformada em matéria do jornal O Estado
de São Paulo, o jornal chegou a uma vendagem recorde de 5.400 exemplares,
patamar nunca mais alcançado.
A manchete
dizia "Hunos da nova espécie" e a sub-manchete, "O famigerado
Lampião e seu grupo de asseclas atacam Mossoró". As chamadas diziam
"A heróica defesa da cidade" e "É morto o bandido Colchete é
gravemente ferido o lombrosiano Jararaca".
Cid Augusto
Em seu livro
"Escóssia", Cid Augusto transcreve a reportagem, que é introduzida
por comentário discordando do adjetivo atribuído a Jararaca na chamada, e que
pode ser conferida abaixo na íntegra:
"- Não,
nada. Sujeito simpático. Ele começou me dizendo que se chamava José Leite,
tinha 27 anos e nasceu no dia 5 de Maio em Buíque, Pernambuco. Sujeito moreno,
muito moreno, mas não era negro. Era solteiro e andava com Lampião há um ano e
alguns meses. Ele tinha um fuzil mauser e cartucheiras de duas camadas, ms 560
mil réis no bolso e uma caixinha com obras de ouro no valor de 1 conto de réis.
O cangaceiro Massilon
Disse que o ataque a Mossoró foi idealizado por Massilon Leite e que Lampião
relutou um pouco, por causa da história das duas Igrejas. Que quando Lampião
chegou a Mossoró não gostou nada, nada, daquela 'igreja da bunda redonda' (de
onde estavam partindo os tiros contra o bando). De repente, Jararaca começava a
rir, diz Lauro da Escóssia, e a gente perguntava por que, espantado como um
homem com um buraco de bálano peito ainda conseguia rir.
-Mas, enfim,
Jararaca, para que Lampião queria tanto dinheiro?
'- Era pra
comprar os volantes de Pernambuco.'
Voltamos a
outros episódios com Jararaca na prisão.
Clementino José Furtado - Quelé
Kelé não
entrou na cadeia. Um seu ordenança, negro bem alto chegou perto de Jararaca, tendo-lhe
arrancado do pescoço, num gesto brusco, uma volta de ouro que trazia com uma
medalha de Santa. Depois cobiçou um anel que o bandido trazia no dedo. Jararaca
tentou tirar, não conseguindo, ao que o negro foi logo dizendo: '- Coloque a
mão aqui. Eu vou cortar o dedo para tirar o anel'. E puxou um faca (facão) ao
que o Dr. Marcelino implorou:
'- Meu senhor,
não faça isto. Cortar o dedo na minha frente, não'.
O negro
desistiu, por certo atento à sensibilidade do doutor.
Jararaca, fez
um pedido com certa ironia:
'- Tragam Kelé
que eu quero dizer quem é cangaceiro'.
Disse depois:
'- Kelé era do
nosso bando e a polícia paraibana fez dele um sargento para nos perseguir'.
Mesmo ferido,
Jararaca não escondia seu riso, o desejo de ainda viver e no momento em que uma
linda jovem de nossa sociedade penetrava na sala, atenta à sua curiosidade para
ver o bandido, este pergunta:
'- Esta moça é
daqui?'. Ao que, recebendo a afirmativa, disse: '- Se o capitão (Lampião)
soubesse que aqui tinha uma moça tão bonita teria entrado na cidade.'
A uma pergunta
de D. Marola Silva (esposa do Sr. Veriato Silva), se os vinte e tantos traços
que tinham na coronha de sua arma eram anotações de morte feitas pelo mesmo,
como dizem, respondeu-lhe:
'- É tudo
mentira, minha senhora. Eu nunca matei ninguém'. E deu uma boa gargalhada,
saindo o vento pelo furo do peito. Apenas impaciente ficou seguidas horas
naquele sofrimento, pelo que chegou a pedir um canudo de mamão e algumas
pimentas malaguetas, dizendo que com isso ficaria bom.
Perguntei-lhe
como. Disse: '- No bando, quando alguém recebe ferimento como este (apontando
para o peito), sopra-se malagueta pelo canudo colocado na ferida. Sai toda
salmoura do outro lado. Arde muito, mas a gente fica curado'.
Mas, apesar de
tudo isto, Jararaca vinha aos poucos melhorando e se tivesse sido medicado
convenientemente não morreria pelos ferimentos.
Tenente Laurentino de Morais - honoriodemedeiros.blogspot.com
O tenente
Laurentino de Morais tinha ido a Natal de onde voltou na quarta-feira seguinte.
Esperou pela quinta, quando Jararaca seria transportado para Natal. Alta noite,
da quinta para a sexta-feira, levaram Jararaca, não para Natal e sim para o
cemitério, onde já estava aberta a sua cova.
Disse o
bandido: '- Vocês não me levam para Natal. Sei que vou morrer. Vão ver como
morre um cangaceiro!'
Naquele local
foi-lhe dada uma coronhada e uma punhalada mortal. O bandido deu um grande urro
e caiu na cova, empurrado. Os soldados cobriram-lhe o corpo com essa areia.
Capitão Abdon Nines - jotaemeshon-coroneisdapmrn.blogspot.com
Essa
ocorrência feita às escondidas foi guardada com as devidas reservas por alguns
dias. Tempos depois, o capitão Abdon Nunes, naquela época comandante da
guarnição policial de Mossoró, revelou em depoimento a morte de Jararaca'.
http://www2.uol.com.br/omossoroense/160305/universo.htm
Ilustrado por José Mendes Pereira
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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