Por: Leonardo
Motta
Sempre que o
coração cruel de Lampião se abrandava num gesto compassivo, Sabino Gomes, seu
lugar-tenente, resmungava, contrariado.
Quando foi, por exemplo, da ocupação da cidade cearense Limoeiro do Norte, Lampião rendeu-se às súplicas do vigário local para não saquear as casas de comércio. Sabino, visivelmente irritado, mandava o padre rezar e cuidar da sua igreja, não se metendo em coisas que não são da conta de quem veste batina.
Sabino foi
morto pelo próprio Lampião, que sempre o temeu, se arreceou do seu crescente
prestígio no bando e se tornou cobiçado dos cinquenta e tantos pacotes que
Sabino trazia sob a cartucheira.
- Antes que
ele me queira jantar, eu o almoço! Decidiu Lampião, suspeitoso de que Sabino,
mais hoje, mais amanhã, o abatesse com um tiro, para se apoderar da centena de
contos de réis que também ele, Virgulino, acarinhava de encontro à cinta.
Uma das
preocupações de Sabino na vida de crimes a que se entregou era vingar a morte
dum seu irmão, o Gregório, rapaz pacato e benquisto, eliminado numa emboscada
pelo Zé Favela. Nunca se pôde saber a causa desse assassínio.
Um dia,
casualmente chegando a uma fazenda, Sabino e seus cabras encontraram o Zé
Favela, desarmado. Reconhecê-lo e arrastá-lo para o terreiro, a fim de ser
sangrado, foram coisas simultâneas. Antes, porém, que a vingança se consumasse,
a dona da casa, com um crucifixo à mão, implorou do sicário, aos gritos:
- Seu Sabino,
lhe peço por esta image: não mate o home! É o premêro pedido que lhe faço e se
alembre que o sinhô nunca chegou nesta casa que não tivesse comidoria e
arrancho e a gente não lhe botasse no piso da poliça! Me faça isso, seu Sabino,
não mate o home!
Sabino quedou
um instante e falou pro Zé Favela:
- Cabra, tu
vai me dizer uma coisa: por que foi que tu matou meu irmão?
Zé Favela,
sobranceiro como um nobre condenado, que altivamente aguardasse a morte,
redarguiu, sem pestanejar:
- Seu Sabino,
eu matei seu irmão, enganado.
- Enganado
como, cabra mentiroso?
- Cabra
mentiroso, não seu Sabino! Eu matei seu irmão enganado! Matei ele, enganado,
porque eu ia matar era o senhor!
A confissão
era verdadeira, mas brutal! Os companheiros de Sabino sentiram que o Favela não
seria poupado. Mas o interrogatório prosseguia:
- Me matar por
quê, cabra, se eu nunca te fiz mal?
- Eu ia matar
o sinhô pra ganhar 50$000 do Joaquim Manduca, da “Boa Esperança”.
- Bem!
deliberou Sabino. Você agora vai nos mostrar o caminho daqui pra “Boa
Esperança”.
De novo, a
mulher choramingou:
- Seu Sabino,
lhe vem uma raiva no caminho e o sinhô acaba é matando este home numa volta da
estrada! Seu Sabino, me atenda! Seu Sabino…
- Ora,
larguemo de mamãezada! Aborreceu-se o próprio Zé Favela, em favor de quem eram
os rogos da dona da casa. O home só morre quando a hora é chegada! Quem morre
na véspera é porco ou piru. Vambora, seu Sabino!
E saiu,
resoluto, a guiar o grupo de cangaceiros. Quando avistaram a “Boa Esperança”,
Zé Favela pediu:
- Seu Sabino,
me dê um rife que o “serviço” no Joaquim Manduca quem faz sou eu. Se o sinhô me
aceita, eu caio na vida da espingarda, debaixo de suas orde. Lhe prometo não
lhe fazer vergonha, porque eu cá sou um cabra ditriminado e tanto me faz morrer
hoje como na sumana que vem!
Sabino esteve a refletir e, logo com firmeza:
- Não! eu não
posso me esquecer nunca de que foi você que matou meu irmão… Agora, puxe por
ali! Depressa, se não quer que eu faça com você o que você fez com o Gregório…
Zé Favela
rodou nos calcanhares.
Aos seus
cabras, estupefatos ante aquele gesto de clemência, Sabino explicou, acendendo
um cigarro:
- Eu não
perdoei este peste, devido a diabo de rogativa de mulher, não! Perdoei porque
ele teve a coragem de me dizer a verdade. Cabra macho de todos os seiscentos:
tudo quanto era de faca fora das bainha, ele me disse, de cara e sem tremer o
beiço, que matou meu irmão enganado: – ia matar era a mim! Numa apertada hora
daquelas, pra um home me dizer o que este cabra me disse, precisa não saber o
que diabo é medo!
Fez uma pausa
e, depois, soltando com força uma baforada de cigarro:
- Um cabra destes não se mata! Deixa isso viver pra tirar raça!
Fonte: Livro
“No Tempo de Lampião”, de Leonardo Motta.
Transcrição:
Geraldo Antônio de Souza Júnior (Administrador)
Os comentários do pesquisador Chagas
Nascimento no facebook, página Geraldo Júnior, sobre o cangaceiro Sabino das Abóboras:
Sobre o primeiro parágrafo, tem um fundo de
verdade. No ataque a Mossoró-RN, Sabino quase é baleado, e o tiro,
provavelmente, partiu do campanário da Igreja São Vicente. No dia seguinte, em
passagem pela fazenda Veneza, já na fronteira do RN. Com o CE. Ele
comentou com o Sr. Childérico, encarregado da fazenda: "O PRIMEIRO PADRE
QUE EU PEGAR, VOU DAR-LHE UMA BOA SURRA". Taí a explicação do mau humor
com o padre de Limoeiro do Norte-CE.
Outro fato que
mostra o prestígio de Sabino junto a Lampião, também aconteceu na Fazenda
Veneza. Lampião pede ao Sr. Childérico, que lhe armasse três redes para o
descanso. Uma rede, o próprio ocupou. As outras duas, foram ocupadas pelo refém
coronel Antonio Gurgel e Sabino. Portanto, ficaram sem essa regalia o seu irmão
Ezequiel e seu cunhado Virgínio.
Acredito que o
Lampião fazia de propósito. Sabino era o homem da vanguarda, era quem chegava
causando o terror. Lampião, como sempre, chegava depois da desgraça feita.
Este mesmo
Mergulhão, é um dos que atravessaram o velho Chico. Também foi o primeiro, dos
seis que atravessaram o rio, a morrer em combate. No início de 1929 é baleado,
carregado ferido pelos companheiros, não resiste e morre no mato.
Fonte: Facebook
Página: Geraldo Júnior O Cangaço
Nota: Alguns escritores afirmam que quem matou Sabino foi o cangaceiro Mergulhão.
Nota: Alguns escritores afirmam que quem matou Sabino foi o cangaceiro Mergulhão.
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