(Sobre os
livros confrontantes “Lampião o Mata Sete” e “Lampião contra o Mata Sete”)
Enéas
Athanázio
É curioso
observar como o cangaço continua a despertar o interesse dos pesquisadores em geral. No momento em que escrevo tenho conhecimento de que pelo menos dois
livros importantes acabam de ser publicados sobre o tema, existe um filme em
andamento e são várias as matérias de jornal abordando o assunto. Isso se
justifica, em parte, pelo fato incontroverso de que o cangaço foi um fenômeno
brasileiro por excelência, com características próprias, sem similar na
história ou no mundo, o que talvez explique a razão de tal interesse, inclusive
de investigadores estrangeiros de várias áreas. E falando em cangaço, uma
figura emerge da história e se alteia sobre as demais, qual seja Virgulino
Ferreira da Silva, o Lampião, cognominado o Rei do Cangaço. Tido como modelo da
coragem, inteligência e liderança do homem sertanejo, enfrentou por quase duas
décadas a vida errante de bandoleiro, à frente de seus homens, desafiando a
perseguição das volantes de sete estados nordestinos e só foi eliminado graças
a uma traição, enquanto dormia, no interior da chamada Grota do Angico, em
Sergipe.
Homem
duro, implacável com os inimigos, ninguém jamais se atreveria a colocar em
dúvida sua hombridade e nunca pairou a menor sombra a respeito de sua condição
de homem-macho. Mas eis que de repente, quando menos se esperava, e, ao que
parece, inspirado pelo antropólogo Luís Mott, surge o livro “Lampião, o Mata
Sete”, de autoria do magistrado aposentado Pedro de Morais, onde o autor
sustenta que Lampião foi afeminado desde mocinho e teria sido homossexual, além
de manter uma “ménage a trois” com Maria Bonita, sua mulher, e Luís Pedro,
integrante de seu grupo, em plena caatinga. Não bastasse isso, sustenta que
Maria Bonita manteve relações com outros homens na vigência do casamento. As
teses do autor se baseiam em indícios e informações que, segundo ele,
comprovariam os fatos, ainda que contrariando a imensa bibliografia sobre o
assunto, a opinião dos estudiosos e o testemunho de incontáveis pessoas em
diversas épocas. O livro vem provocando verdadeiro terremoto, uma vez que, na
opinião geral, Lampião pode ter sido tudo, ou quase tudo, exceto um
homossexual.
A reação
não tardou e começaram a surgir manifestações em contrário, avultando entre
elas o livro-contestação “Lampião contra o Mata Sete”, de autoria de Archimedes
Marques (Info Graphics Gráfica e Editora – Aracaju – 2012). Estudioso do
assunto de muito tempo, leitor aficionado da bibliografia existente e com
pesquisas realizadas in loco, o autor se debruçou sobre a obra de Pedro de
Morais, examinando-a capítulo a capítulo, página a página, parágrafo a
parágrafo em cotejo com as opiniões de numerosos outros autores para concluir
que as teses nele defendidas são improcedentes e não encontram qualquer amparo
em provas, mesmo indiciárias, tudo não passando de verdadeira ficção. Para
tanto, buscou subsídios em numerosos autores de várias épocas, desde aqueles
que foram contemporâneos de Lampião até os mais modernos, sem esquecer os
ensaístas consagrados cujas obras constituem referências. Numa espécie de
operação desmonte, tudo foi submetendo a uma análise crítica implacável, muitas
vezes contundente, rebatendo as afirmações com cerrada argumentação. Ao longo
de 550 páginas densas e pensadas, esmiuçou a obra em questão de tal forma a não
deixar pedra sobre pedra, recolocando tudo nos devidos lugares e devolvendo a
Lampião a masculinidade que jamais lhe fora negada.
Embora não
seja especialista no assunto, tenho lido bastante sobre o cangaço e Lampião e
até escrito a respeito. Nessas leituras nunca deparei com qualquer insinuação
sobre a homossexualidade do chamado Rei do Cangaço, suas relações com outros
homens ou a triangulação com Maria Bonita e o cangaceiro Luís Pedro. Em
livro recente, denominado “De olho em Lampião: violência e esperteza”, de
autoria de Isabel Lustosa, pesquisadora titular da Fundação Casa de Rui
Barbosa, não encontrei qualquer referência ao assunto. Como se trata de obra
visivelmente contrária ao cangaceiro, não creio que silenciasse sobre o fato
caso houvesse sustentação para tanto. Também na obra “Lampião – Entre a espada
e a lei”, de autoria do magistrado potiguar Sérgio Augusto de Souza Dantas,
trabalho criterioso e exaustivo sobre a vida e os feitos de Lampião, nada
encontrei a respeito. Como não seria possível esconder essa pretensa
homossexualidade de todos e por tão dilatado espaço de tempo, ainda mais em se
tratando de personagem histórico tão estudado, acredito que tudo não vai além
do terreno da mera suposição.
A par do
debate sobre o tema em todas suas minúcias, o autor Archimedes Marques fornece
inúmeras informações a respeito de Lampião, seu grupo, o cangaço em geral e o
meio sócio-econômico onde se desenvolveu. Apenas esse conjunto de elementos
paralelos já faria do livro “Lampião contra o Mata Sete” uma grande obra.
Sobre o autor Enéas Athanázio: Contista, crítico, biógrafo com
extensa bibliografia, é um dos escritores mais publicados e conhecidos de Santa
Catarina. Reside em Balneário Camboriú e é m dos fundadores de Literatura
– Revista do Escritor Brasileiro, na qual tem colaborado assiduamente.
Bibligrafia: O Peão Negro (contos,
1973); Dimensões de Lobato (ensaios, 1975); O Azul da Montanha
(contos,1976); Godofredo Rangel (biografia, 1977); O Promotor
Público na Justiça Eleitoral ( jurídico, 1978); Meu Chão (contos, 1980);
o Mulato de Todos os Santos (ensaios, 1982); Tapete Verde
(contos,1983); Figuras e Lugares (ensaios,1983); A Pátina do
Tempo (ensaios,1984); Falando de Gilberto Amado (ensaios, 1985);
Presença de Inojosa (ensaios,1985); Erva-Mãe (contos,1986); Meu Amigo
Hélio Bruma (ensaios, 1987); Tempo Frio (contos,1988); O Amigo
Escrito (biografia,1988); A Cruz do Campo
(novela,1989); O Perto e o Longe – Vol.
I (ensaios,1990); O Perto e o Longe – Vol. II
(ensaios,1991); O Aparecido de Ituy (contos,1991); Enéas
Athanázio (biografia e antologia, 1991); Jornalista por Ideal
(ensaios,1992); São Roque da Ventania (novela,1993); Roseilho
Velho (contos juvenis,1994); Adeus Rangel (ensaios, 1994); Fiapos de
Vida – Vol. I (causos nanicos,1996); Um Artista Chamado Antônio
(biografia,1997); Vida Confinada (autoficção,1997); As Razões
da Queda (ensaio,1998); A Gripe da Barreira (contos,1999); Fazer o
Piauí (ensaios, 2000); O Cavalo Inveja e a Mula Manca (contos,
1991); As Antecipações de Lobato e outros escritos (ensaios,
2001); Mundo Índio (ensaios, contos e artigos, 2003); Fiapos de Vida
– Vol. II (minicontos,2004); Crônicas Andarilhas (crônicas, 2005);
Direito Internacional Público (jurídico, 2006); A Liberdade
Fica Longe (novelas, contos e crônicas, 2007); O Pó da Estrada (crônicas,
2008); Meu Amigo, o Piauí (critica, 2008); Ensaios Escoteiros(ensaios,
2010).
Opúsculos: Algemas (contos, 1988);
Sílvio Meira (ensaios,1989); Joaquim Inojosa e a Pregação Modernista – ensaios
– duas edições – 1983 e 1984; Martinho Bugreiro, Criminoso ou Herói? –
ensaio – 1994; 7 Causos Nanicos – minicontos – 1985; Monteiro Lobato
Abriu os Caminhos – ensaio – 1993; Como Casei com a Filha do Coronel
– conto – 1991; A Ilha Verde – crônica – 1995; A Pátria
Comum – artigo – 1995; Solidão, Solidão – contos – 1995; Novo e
Diferente – artigos – 1996; O Regionalismo Passado a Limpo – ensaio –
2000; A Liberdade Fica Longe – novela – 2001; José Athanázio, Meu
Pai – biografia – 2006
Para adquirir
um exemplar deste livro, escreva para o autor no endereço:
archimedes-marques@bol.com.br
Boa leitura
http://gibanet.com/2012/07/31/historia-cangaceira/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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