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segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

A HISTÓRIA DA “COLUNA INVICTA” QUE NÃO VENCEU

Por Antonio Corrêa Sobrinho

Subindo montanhas, descendo rios, atravessando pântanos, cortando florestas virgens, caminhando horas a fio, um grupo de 1.500 rebeldes, comandado pelo capitão Luiz Carlos Prestes, desafiou por mais de dois anos – do final de 1924 ao início de 1927 – as tropas do Governo Artur Bernardes e até cangaceiros. A Coluna Prestes – ou “Coluna Invicta”, por não ter perdido batalha – tinha como objetivo derrubar o Governo Bernardes. Não conseguiu, após uma marcha de 25 mil quilômetros, que terminou na Bolívia.

O começo foi no dia 5 de julho de 1924 – exatamente dois anos depois do levante conhecido como “Os Dezoito do Forte”, em 1922. Uma nova revolução tomou conta de Sergipe, Amazonas e São Paulo. Nos dois primeiros Estados, o Governo dominou a rebelião facilmente.

Em São Paulo, contudo, os rebeldes, comandados pelo general Isidoro Dias Lopes e pelo major da Força Pública de São Paulo, Miguel Costa, ocuparam a Capital por três semanas, até serem expulsos. Rumaram então para o oeste e chegaram ao Mato Grosso. Daí se deslocaram para Guaíra, no Paraná.

Envolvidos com a revolução desde 1922 – só não participara do movimento “Os Dezoito do Forte” por estar com tifo -, o capitão Luiz Carlos Prestes, servindo no 1º Batalhão Ferroviário de Santo Ângelo (Rio Grande do Sul), solicitou licença para tratamento de saúde, até pedir seu afastamento do Exército em setembro de 1924. Ele jurara fidelidade aos poderes constituídos e não admitia participar da revolução na ativa.

No dia 29 de outubro, aconteceu o levante gaúcho. Ajudado por dois tenentes, Prestes sequestrou o comandante do Batalhão Ferroviário, major Siqueira Montes, assumindo o comando da tropa. Eram 300 homens, que o apoiaram. Além do Batalhão Ferroviário de Santo Ângelo, Prestes reuniu o 2º Regimento de Cavalaria de São Borja, o 3º Regimento de São Luiz Gonzaga e o 3º de Uruguaiana. E partiu para se unir às forças paulistas.

Eram 1.500 homens no total – 800 da Coluna Rio Grande, comandada por Prestes; e 700 da Coluna São Paulo, comandada por Miguel Costa. O comandante paulista defendia a luta frontal contra as forças do Governo, enquanto Prestes sustentava que a pouca munição e a falta de equipamentos indicavam a necessidade de uma tática de guerrilha. Só assim, garantia ele, a Coluna poderia alcançar seu objetivo. Ou seja: percorria o interior do País, atraindo as atenções das tropas federais, enquanto poderiam ser organizados outros movimentos nas Capitais.


Foram 25 mil quilômetros, cobrindo Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás, Minas, Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Ceará, Paraíba e Bahia.

A pé ou a cavalo, precariamente armados, com fome e sede, os rebeldes escaparam de grandes cercos dos contingentes do Governo. Daí Prestes ter optado pela guerrilha.

Um dos exemplos desta tática foi registrado durante uma batalha em Piancó, na Paraíba. Três colunas do Governo, somando 15 mil soldados, tentaram cercar a Coluna Prestes, acampada na fazenda Buenos Aires, num contraforte da Serra Negra. Prestes, então, ordenou que seus homens, após fazerem um giro de 23 léguas, entrassem na caatinga, abrindo picadas, andando dia e noite. A marcha da Coluna Prestes descrevia um arco que saía do rio São Francisco, atravessando o sertão rumo à Bahia. A manobra ficou conhecida como “laço húngaro”, pois o trajeto era muito parecido ao laço que servia de ornamento ao uniforme do Exército.

Na perseguição a Prestes e seus homens, foram utilizados também temíveis cangaceiros, entre eles Virgulino Ferreira da Silva, o “Lampião”, o mais famoso dos bandoleiros das caatingas nordestinas. O grupo de Lampião, contratado pelos “coronéis” da região, não chegou, entretanto, a travar um combate direto com a Coluna. Houve apenas algumas escaramuças, nas quais os dois grupos se utilizavam da guerrilha.

Na verdade, o cangaceiro – preso e decapitado pelos “volantes” do tenente João Bezerra em Angicos (SE), no ano de 1938 – foi apenas mais um instrumento que os “coronéis”, atemorizados com o avanço da Coluna por suas terras, tentaram, sem sucesso, utilizar, contra Prestes. O “Rei do Cangaço” e o “Cavaleiro da Esperança” não chegaram, porém, a trocar um só tiro.

Mais de dois anos após a partida, a Coluna chegou à Bolívia, onde depôs suas armas e Prestes iniciou o exílio, após um entendimento com o Presidente Washington Luís, que acabara de eleger-se.

Prestes, no exílio, confessou o quanto foi dura a jornada:

- Os homens se alimentavam quando havia qualquer alimento. Um dia, no Piauí, encontramos várias cobras, que bem serviram para saciar a fome. De resto, caminhávamos sempre, a cavalo ou a pé. Aqueles homens tinham um grande orgulho de pertencer à Coluna.

Jornal O GLOBO – 08/03/1990

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